Tocando Agora: ...

A Lavagem Cerebral da Criação do "Inimigo Interno": Quando o Estrangeiro Vira Inimigo

Publicada em: 23/05/2025 07:20 - Artigos

Uma das ferramentas mais poderosas e perigosas da manipulação ideológica é a criação do chamado inimigo interno. Essa estratégia, utilizada por regimes autoritários, governos populistas e movimentos nacionalistas extremos, consiste em identificar um grupo minoritário dentro da própria sociedade — seja por origem étnica, religiosa, cultural ou geográfica — e transformá-lo, na narrativa pública, em uma ameaça existencial à nação, aos valores nacionais, ao bem-estar coletivo ou até mesmo à segurança estatal.

No contexto do estrangeiro residente legalmente em um país, essa técnica toma forma particularmente cruel: o cidadão ou imigrante que vive sob as mesmas leis, paga impostos, contribui para a economia e compartilha dos mesmos espaços públicos é subitamente rebaixado a figura do outro, do invasor, do agente corruptor.

Como Funciona a Técnica

1. Identificação do Inimigo:

A primeira etapa envolve a escolha do grupo-alvo. No caso do estrangeiro, isso pode ser feito com base em critérios como origem geográfica (ex.: pessoas de certos países), língua, cultura, religião ou até características físicas. Esse grupo é então distanciado simbolicamente da população majoritária.

2. Construção da Narrativa do Perigo:

Uma narrativa é construída em torno desse grupo, retratando-o como portador de doenças, criminoso latente, economicamente parasitário ou moralmente inferior. Mídia, discursos políticos e redes sociais são usadas como canais de difusão dessa mensagem. O objetivo é gerar medo, repulsa e hostilidade.

3. Desumanização Sistemática:

Para que o ódio seja aceito socialmente, é preciso desumanizar o outro. O estrangeiro deixa de ser visto como pessoa e passa a ser encarado como símbolo de tudo aquilo que o grupo dominante odeia: corrupção, desordem, pobreza, violência, ou simplesmente “diferença”. Nesse processo, ele não tem direitos morais, apenas rótulos negativos.

4. Legitimação do Ódio por meio da Politicagem:

Políticos e líderes manipuladores assumem o papel de “protetores” da nação contra essa ameaça imaginária. Eles legitimam o ódio ao apresentar ações violentas ou discriminatórias como necessárias para a preservação da ordem e da pureza nacional. Medidas como restrições ao acesso a instituições públicas, expulsões forçadas ou limitações a direitos civis são justificadas como “medidas de defesa”.

5. Divisão e Conquista:

Ao criar um inimigo comum, os responsáveis pela manipulação dividem a sociedade entre “nós” e “eles”, canalizando frustrações econômicas, sociais ou emocionais para fora do sistema político real. Em vez de questionar a corrupção, a má gestão ou a desigualdade, o povo é induzido a atacar o estrangeiro.

6. Reforço Social e Comportamental:

Com o tempo, o ódio torna-se parte do senso comum. Expressões xenófobas deixam de ser isoladas e se tornam aceitas publicamente. Discriminação torna-se normalizada, e até mesmo a violência física contra estrangeiros é tolerada ou celebrada.

Condenação: O Poder do Ódio e Sua Violência Sutil

Essa técnica de lavagem cerebral não apenas corrompe a razão, mas também destrói a ética coletiva. Transformar um ser humano em inimigo é um crime contra a humanidade. É uma violência psicológica e social que, embora invisível, deixa cicatrizes profundas na alma de uma nação.

Quando o estrangeiro é impedido de acessar instituições públicas, quando é tratado como um intruso no próprio espaço onde trabalha e mora, estamos falando de uma forma de apartheid moderno — um apartheid intelectual, moral e social. Isso não protege ninguém. Isso enfraquece todos.
Políticas de ódio não resolvem problemas; criam novos inimigos. Não fortalecem a unidade nacional; fragmentam-na. Não defendem a segurança; alimentam o caos.

Alternativa: Humanidade como Princípio

A única resposta verdadeira a essa lavagem cerebral é a resistência consciente. Resistir não significa apenas dizer “não” ao ódio, mas dizer “sim” à diversidade, ao diálogo, ao reconhecimento mútuo e ao direito inalienável de cada ser humano viver com dignidade.

O estrangeiro não é um inimigo. É um irmão, um vizinho, um colaborador. Ele carrega consigo histórias, sabedoria e esperança. Tratá-lo como ameaça é trair a própria essência da civilização.

Que possamos nos livrar do veneno da mentira coletiva e cultivar, em seu lugar, o solo fértil da compaixão e da verdade.

Compartilhe:
Comentário enviado com sucesso!
Carregando...